
É interessante observar como as fronteiras mais avançadas da ciência e da tecnologia muitas vezes se baseiam em sonhos muito, muito antigos. Um exemplo? A busca pela longevidade e até pela imortalidade, que no passado despertou o interesse entre alquimistas e filósofos e, hoje, atrai a atenção de cientistas que buscam formas de prolongar a vida humana. Nesta edição de #FuturoPresente, vamos conhecer algumas das perspectivas nesse campo ousado e desafiador, que não tem medo de se perguntar até que idade poderemos viver.
⏳ Afinal, como viver mais?
Essa era uma pergunta frequente, por exemplo, entre os antigos alquimistas chineses e os ascetas hindus. Para eles, alcançar a “imortalidade” envolvia, além de aspectos espirituais ou religiosos, exercícios físicos e de respiração, regras dietéticas estritas e cuidados com a higiene pessoal. Nada tão “estranho” e nem tão diferente, em linhas gerais, do que prega a medicina atual – um caminho lógico, na verdade.
Nos últimos cem anos, aliás, o mundo evoluiu muito em longevidade média justamente graças à melhoria da alimentação, do estímulo às práticas físicas e da implementação de programas extensivos de saneamento básico. Sem contar, é claro, com avanços espetaculares na medicina e na farmacologia.

⏱️ A longevidade além do padrão biológico
Aqui, há uma questão: a implementação dessas medidas aumentou, claro, a longevidade. Para isso, ela reduziu a mortalidade infantil, rompendo uma cadeia de mortes antes do tempo. Com isso, aproximou a vida humana de seu limite natural, o que é excelente. Mas não “arranhou” qualquer possibilidade de ir além. Explicamos.
Quando falamos em longevidade, estamos falando em ir além do padrão natural atual por meios que permitam a regeneração celular, a preservação cognitiva e da saúde física. A coisa, inclusive, namora com a ideia de imortalidade – e é nisto que os cientistas estão mirando!
⌛ O limite biológico humano hoje
Antes de chegar aos avanços, é interessante situar o alcance máximo da vida humana atualmente. Com base em dados estatísticos e no acompanhamento dos chamados superidosos – pessoas acima de 80 anos com excelente saúde física e mental –, estima-se que o limite biológico humano esteja entre 120 e 125 anos.
O que, convenhamos, é uma idade extraordinária, a que pouquíssima gente chega: a ONU estima que, em 2025, existam cerca de 630 mil pessoas com mais de cem anos; e apenas uma delas, a inglesa Ethel Caterham, está viva aos 116 anos (outra superidosa que chegou a esta idade foi a brasileira Inah Canabarro Lucas, que faleceu neste ano). E quem foi o ser humano mais longevo documentado pela ciência? A francesa Jeanne Calment, que faleceu em 1997 com 122 anos.

🛠️ Romper a barreira do tempo
Esse, enfim, é o desafio: mas, como chegar lá? Ao examinar as pesquisas e as discussões sobre o tema, é possível perceber duas linhas mais aparentes de “ataque” ao problema.
A primeira, baseada em avanços importantes nas últimas décadas, vê possibilidades nos transplantes, em órgãos artificiais ou modificados de outros animais (como porcos, por exemplo) e até na impressão em 3-D de vísceras.
A despeito do grande sucesso dos transplantes e das terapias anti-rejeição, eles não parecem ser o caminho mais indicado para romper a barreira dos 120 anos. E isso, afirmam os cientistas, se deve a alguns fatores, começando pelo de que os organismos envelhecem de forma sistêmica. Nesse contexto, uma víscera nova não seria suficiente para reverter o processo – a menos, é claro, que houvesse uma forma de “trocar totalmente de corpo” mantendo a consciência, o que, para o momento, pertence 100% ao universo da ficção científica.
Sem contar o fato de que para um órgão essencial ainda não há possibilidade de transplante: estamos falando do cérebro, que é totalmente associado à personalidade.
Há, também, outras questões, como a inexistência de técnicas suficientemente avançadas de produção de novos órgãos – de base biológica ou artificial – específicas para as substituições, e o preço dos transplantes, que é altíssimo.
✂️ A “vida eterna” de dentro para fora
A segunda abordagem, vista por muitos cientistas como mais viável, desce vários graus em relação à escala. A proposta da chamada Medicina de Transcriptômica (ou Transcricional) é utilizar técnicas de edição e modificação genética – como as do RNA Mensageiro (mRNA, a mesma tecnologia utilizada nas vacinas anti-Covid) e do CRISPR (de que tratamos em outra edição de #FuturoPresente) – para transformar o comportamento das células.
Com isso, uma mesma célula, com seu “relógio” modificado, poderia rejuvenescer; no caso das células-tronco, elas poderiam ser direcionadas para se converter em outras células jovens e capazes de substituir tecidos comprometidos.
Há, também, uma possibilidade fantástica nascida do conhecimento cada vez maior da genética das pessoas superidosas. O que seu “mapa genético” tem de diferente? Sabendo disso, seria possível ajustar os “mapas” das pessoas comuns para que também vivam mais e melhor.
Entre as empresas de maior poder que estão trabalhando em processos em nível genético está a Altos Labs (EUA), inaugurada em 2022. Ela tem como presidente do conselho consultivo o japonês Shinya Yamanaka, ganhador do Nobel de Medicina de 2012 por uma pesquisa de reversão do envelhecimento, e é financiada por uma das pessoas mais ricas do mundo, o bilionário Jeff Bezos.

♻️ Conclusão: viver mais ou viver melhor?
Em um mundo que envelhece a olhos vistos – em especial nos países mais ricos, onde a taxa de reposição populacional insuficiente gera sérias preocupações sociais e econômicas –, a busca pela longevidade é mais do que a tentativa de realizar um sonho ancestral. Ela traz consigo conhecimentos que podem ajudar a espécie humana a viver mais e melhor dentro dos limites estabelecidos pela própria biologia.
E, de olho em um futuro mais distante, em um tempo de ainda mais tecnologia, a longevidade também pode ajudar a viabilizar a presença humana em outras regiões do universo. Explicamos: como as distâncias interestelares são enormes – com a tecnologia atual, chegar aos limites do Sistema Solar leva 50 anos! -, colonizar outros planetas pediria, provavelmente, uma vida mais extensa para suportar as viagens.
O direcionamento de grandes somas de dinheiro para essas pesquisas, porém, também gera reflexões. Afinal, vivemos em um tempo em que a mortalidade infantil ainda está presente em várias regiões do mundo; do mesmo modo, a morte prematura de jovens causada pela violência urbana e em conflitos armados também é uma grande preocupação. Sem contar o comprometimento do meio ambiente pela exploração massiva e irresponsável, que afeta a saúde e compromete a sobrevivência da nossa espécie.
Todos querem viver mais, e a ciência deve seguir pesquisando e crescendo. É preciso pensar também, porém, em viver melhor, estendendo este benefício a todos os seres humanos.